Este Evangelho tem características muito próprias, que o distinguem dos
Sinópticos. Mesmo quando refere idênticos acontecimentos, João apresenta
perspectivas e pormenores diferentes dos Sinópticos. Não obstante,
enquadra-se, como estes, no mesmo género literário de Evangelho e
conserva a mesma estrutura fundamental e o mesmo carácter de proclamação
da mensagem de Jesus.
Este Evangelho tem na base uma testemunha ocular «que dá testemunho
destas coisas e que as escreveu» (21,24; ver 19,35). O autor esconde-se
atrás de um singular epíteto: «O discípulo que Jesus amava» (13,23;
19,26; 20,2; 21,24; ver 1,35-39; 18,15). A tradição, a partir de Santo
Ireneu, é unânime em atribuir o IV Evangelho a João, irmão de Tiago e
filho de Zebedeu, um dos Doze Apóstolos.
A análise interna deixa ver que o autor era judeu e tinha convivido
com Jesus. Não constitui problema para a autoria joanina o fato de João
ser um pescador, iletrado; então, era corrente não ser o próprio autor a
escrever a sua obra. Também é provável que um grupo de discípulos
interviesse na redação, sob a sua orientação e autoridade; daí a
primeira pessoa do plural «nós», que por vezes aparece (3,11; 21,24).
Foi este o último Evangelho a ser publicado, entre o ano 90 e
100. Não pode ser uma obra tardia do século II, como pretendeu a crítica
liberal do século passado; a sua utilização por Santo Inácio de
Antioquia, martirizado em 107, e a publicação em 1935 do papiro de
Rylands, datado de cerca do ano 120, desautorizou tal pretensão.
Tem-se discutido muito acerca do meio cultural de que depende;
mas devemos ter em conta a sua grande originalidade e a afinidade com o
pensamento paulino das Cartas do cativeiro. Os discursos de
auto-revelação, que não aparecem em toda a Bíblia, não procedem dos
escritos gnósticos e mandeus (parece serem estes que imitam João); têm
raízes no Antigo Testamento, sobretudo nos livros sapienciais, onde a
Sabedoria personificada se auto-revela falando na primeira pessoa (Pr
8,12-31; Sb 6,12-21).
DIVISÃO E CONTEÚDO
A concepção desta obra obedece a uma linha de pensamento teológico
coerente e unificadora. Face aos vários esquemas propostos, limitamo-nos
a assinalar as unidades do conjunto para deixar ver um pouco da sua
riqueza e profundidade:
Prólogo (1,1-18): uma solene abertura, que anuncia as ideias mestras.
I. Manifestação de Jesus ao mundo (1,19-12,50), como Messias, Filho de Deus, através de sinais, discursos e encontros. Distinguem-se aqui cinco grandes secções:
- 1. Primeiro ciclo da manifestação de Jesus: 1,19-4,54. Semana inaugural.
- 2. Jesus revela a sua divindade: Ele é «o Filho», igual ao Pai: 5,1-47
- 3. Jesus é «o Pão da Vida»: 6,1-71.
- 4. Jesus é «a luz do mundo»: grandes declarações messiânicas por ocasião das festas das Tendas e da Dedicação: 7,1-10,42.
- 5. Jesus é «a vida» do mundo: 11,1-12,50.
II. Revelação de Jesus aos seus (13,1-21,25): manifestação a
todos como Messias e Filho de Deus através do “Grande Sinal”, por
ocasião da sua Páscoa definitiva.
- 6. A Última Ceia: 13,1-17,26.
- 7. Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus: 18,1-20,29.
Epílogo (20,30-21,25): dupla conclusão. Aparição na Galileia.
Além destes temas fundamentais da fé e do amor, João contém a revelação
mais completa dos mistérios da Santíssima Trindade e da Encarnação do
Verbo, o Filho no seio do Pai, o Filho Unigénito, que nos torna filhos "adotivos" de Deus.
Fonte: www.capuchinhos.org
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